Sendo
correto pensar que nossas histórias mais profundas são mais autênticas,
carregam verdades e lições maiores, deveríamos, então, entender melhor o que
encontramos naquela que está na nossa base, no chamado Ocidente: o desafio de
Adão, fonte de inspiração moral, econômica, social, guia para os comportamentos
cotidianos, lição de vida, coragem e esperança.
O primeiro homem, Adão, vive inicialmente no jardim do Éden, lugar de não-desejo,
de inocência e integridade que lhe garante a abundância e o preserva das necessidades
do trabalho. Ele não precisa possuir nada para viver feliz ali, primeiro
sozinho, depois com uma companheira: a primeira necessidade é ter alguém ao
lado, o primeiro repúdio é a solidão.
Somente
duas interdições o limitam, ele não deve comer dos frutos da árvore do
Conhecimento - pois neles descobriria o saber, a consciência de si e, portanto,
a dúvida - nem dos da árvore de Vida - pois com isso ganharia a eternidade. Nos
dois casos trata-se de privilégios de Deus.
Primeira
lição sobre a condição humana: para não desejar, o homem não deve saber a
extensão de sua ignorância nem a finitude de sua condição. Assim que viola uma
das interdições – ao comer o fruto proibido –, ele descobre a consciência de si
e o desejo; é então relegado ao mundo da escassez, onde nada está disponível
sem trabalho. Dessa forma o desejo produz a escassez, diz a história de Adão, e
não o inverso.
Essa
expulsão do jardim do Éden, esse exílio, joga o homem na sua condição de ser
material (nos dois sentidos da expressão). Ele se torna um ser de carne e
sangue e a busca da subsistência se tornará penosa, difícil como o parto para a
sua companheira.
Mas
é agora que começa algo mais interessante, mais forte e desafiador. Adão, o
homem genérico, torna-se então um homem específico, o qual estabelece com Deus
um contrato que transforma a condição humana em projeto: realizar o reino de
Deus sobre a Terra para recuperar a inocência moral, para fazer desaparecer a
privação. A partir de agora, a flecha do tempo vai permitir que o homem escolha
o seu destino, empregue seu livre-arbítrio para o progresso.
Eis
o centro da história. É de coragem que precisamos para superar nossos medos e
reinventar o paraíso perdido, superar nossos erros, superar os conflitos e as
ambições, reinventar o Éden ao fazer o tempo frutificar.
Marina
Gold
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