É
impossível acompanhar a maior manifestação espontânea de nosso povo, sem
refletir no que se passa em teu íntimo.
Imagino-te
jovem, guerreira e corajosa na luta contra a ditadura, sonhando com a
participação popular em defesa da pátria e o restabelecimento da democracia.
Depois de tantos anos, eis-te erguida ao papel de condutora da nação.
Ninguém
ousaria vaticinar que com índices de aprovação tão favoráveis, o teu governo
haveria de se defrontar com tamanho levante pacífico, protestando a plenos
pulmões: Chega de hipocrisia!
Lembras-te,
Dilma? Não foi essa igualmente a tua peleja?! Acredito seja enorme o teu desencanto,
ao verificar que a juventude agora está do lado oposto ao teu. Tu ainda não
representas a esperança de venturosos dias para o sofrimento das gentes. As
valiosas conquistas sociais já efetuadas não extinguem as prementes angústias e
carências da multidão.
O
maior problema brasileiro de saúde chama-se corrupção. Sua abordagem
terapêutica é extremamente complexa porque adquiriu gravidade enorme. Desde um
simples vereador, secretário municipal ou chefe de sindicato ou de autarquia
até aos mais elevados postos dos três poderes da República, os que não agem de
forma ilícita, gozam de privilégios inadmissíveis. E ninguém quer renunciar à
mais comezinha e insignificante vantagem. O rigor da Lei deveria caminhar no
sentido inverso ao atual, fiscalizando, reeducando e punindo de modo rápido e
justo quanto mais instruído o cidadão e maior a representatividade de seu cargo
ou a responsabilidade social de sua função.
Vê,
Dilma, quão grande a tua oportunidade de servir à nossa Pátria Amada! Vence a
inércia e a repetição enfadonha das atitudes superficiais; despreza as medidas
paliativas que visam apenas abrandar a opinião pública. Enfrenta a raiz dos
problemas. Esquece os compromissos partidários, os apadrinhamentos políticos,
eivados de mentira e engodo. Desde o fim da ditadura militar, quase todos os
presidentes viram-se sozinhos num determinado período, vivenciando a chance de
liderar a nação, de verdade, ao lado do povo rumo à ordem e progresso que
ansiamos. Todos eles, porém, preferiram acomodar-se ao apoio das instituições e
ao vínculo com as forças já estabelecidas, adiando as inevitáveis
transformações que brotam esplendidamente hoje em clamor generalizado. Recorda
que a tua principal obrigação é para conosco: nós que te elegemos, ouvindo as
influências que permitimos em nossa livre escolha. Ninguém manipula a vontade
da população indefinidamente. Veste tua honradez e consciência cívica e age com
a liberdade que sempre cultivaste.
Vem
pra rua, Dilma! Não as avenidas apinhadas de gente, e sim as estradas de teu próprio
coração. Retoma as lembranças empoeiradas dos teus mais antigos e acalentados
ideais. Sopra-lhes vida nova, proveniente de tantas refregas e inúmeras lutas e
revigora-os para a imensa batalha. Raríssimas pessoas poderiam, nesta hora tão
decisiva, auscultar a alma popular e acolhê-la com o indispensável carinho como
tu. Foste talhada espiritualmente para esse tremendo desafio...
Somos
nós, os cidadãos anônimos que veneramos o Brasil como pátria idolatrada, que te
abraçamos e pedimos a Deus que te ilumine para as nobres e severas deliberações
que o momento exige.
Gilberto
Ribeiro Vieira
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